Behind Enemy Lines
Marcus- Admin
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- Mensagem nº2
Re: Behind Enemy Lines
Com a American Iniciative, não havia de ser diferente. Se não houvesse um problema, o grupo não teria surgido. Se a partir do problema não brotasse um ideal, dificilmente possuiriam um objetivo. E, se não houvesse um povo, sequer teriam uma razão para seguir em frente. Era tão contraditório ela comparar o povo a gado, a cabeças de bois prontos para serem sacrificados, que prefere desvirtuar aquela linha de raciocínio para que sua existência não representasse agora um paradoxo não solucionável. |
O relato era finalizado, e gerava em Claire um sorriso de satisfação. Após agradecer o contato e encerrar a transmissão, segue para fora e passa por um corredor estreito. Acessa um salão amplo e vazio, para enfim atingir a ala leste do prédio. Deixa para trás cômodos simplórios como cozinha, banheiros e uma placa de sinalização com o escrito G A R A G E M, e pára em frente a uma porta dupla com travas de emergência. Usa as duas mãos para empurrá-la e contempla uma sala ampla, com alguns balcões, ferramentas e meia dúzia de carros parados. Um deles, em especial, encontrava-se suspenso em um elevador. Abaixo dele, nota a silhueta de um homem magro e de estatura mediana. Ao se aproximar um pouco mais, vê as vestes rasgadas e sujas, além de algumas manchas de graxa no rosto. Entrega a chave de fenda para o rapaz antes que pedisse por ela, cruzando os braços em seguida. |
Última edição por Marcus em Qui Mar 14, 2019 11:52 pm, editado 1 vez(es)
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- Mensagem nº3
Re: Behind Enemy Lines
Claire desfere um cruzado de direita em forma de provocação ao questionar a eficiência do irmão, e torna tudo mais afetuoso ao chamá-lo de Mike no final de sua colocação. Sabendo que a irmã gostaria do que viria a seguir, porém fingiria se incomodar para manter a aparência fria, Michael se aproxima lentamente e a abraça, mesmo estando suado e com o rosto e a roupa sujos de graxa. |
Pedindo licença à Claire, Michael sai da garagem e passa pelo mesmo salão que outrora ela atravessara. Ao invés de dobrar para a ala oeste, porém, segue por um corredor alternativo, que dava acesso ao complexo de quartos da base da American Iniciative. Chamar aquilo de complexo, entretanto, era generoso demais. Tratava-se apenas de um corredor com diversas portas exatamente iguais. Se Michael tivesse os mesmos olhos de Claire, consideraria aquilo um conglomerado de prisões. |
Pierre- Mensagens : 16
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- Mensagem nº4
Re: Behind Enemy Lines
Era mais difícil para Sheeva se lembrar dos primeiros vinte anos de sua vida, do que de todos os outros quinhentos e vinte nove. Dos quinhetos e vinte e nove, ela conseguia se recordar bem. Não fugia da sua mente as primeiras duas centenas de anos vivendo como nômade pelo litoral da África, conhecendo várias tribos. Fazendo vários amigos. Sendo presenteada com a paixão de alguns amantes, em especial. Até então, viver pra sempre era difícil. Que motivo a vida possuía? Desde o início o homem luta para conquistar uma carreira bem sucedida, gasta dois terços da vida para conquistar sua paz e termina a vida desfrutando do que semeou – tendo sorte. Mas e se um homem pudesse viver para sempre? Ele lutaria para se tornar o homem mais rico do mundo? O mais sábio? Ou o dominante sobre toda a raça humana? Na vida de Sheeva, ela não optou pelas riquezas. Vivia preocupada somente com o presente. O futuro parecia não estar em suas mãos; sempre pareceu que era ela quem estava nas mãos do futuro. Ela passou duzentos e vinte cinco anos vivendo segundo o ritmo do rio. Como uma pessoa normal teria vivido: desfrutando a existência. Nada de tão grandioso. Nômade, ela passava um determinado tempo com um grupo de pessoas, ou uma tribo. E quando passava tempo demais junto deles – tempo o suficiente para ser descoberta – desaparecia. Porém mesmo com essa vida difícil, conseguiu ter famílias. Filhos. Esposos. Amou, e foi amada. Quantos ela não velou, na sepultura? Era como uma maldição. Às vezes parecia que não ia aguentar; mas ao mesmo tempo, queria viver mais. O que determinou o rumo de sua vida foi voltar ao Egito. Foi na época que Napoleão invadiu o lugar. Aquele foi seu primeiro contato com o mundo ocidental, e ali no tão modificado Egito conheceu Joseph, membro seleto do círculo social de Napoleão. Ele a levou para a França, e Sheeva viveu uma vida de glamour. Parecia o ápice, não? Para muitos, aquele era o estilo de vida ideal: se é pra ser eterno, que seja com riquezas. Mas foi naquele momento que ela teve o primeiro contato com uma seita misteriosa... Que procurava pessoas mágicas. Os anos se passaram, chegou a época que precisou fugir para não ser descoberta: fugiu numa noite, e deixou Joseph para trás. Muitos anos se passaram. E ela vivia esse ciclo nômade. Porém agora tinha uma diferença. Finalmente encontrou um motivo para a sua longa vida. Se dedicaria à encontrar aquela seita, e descobrir seus intentos. Veio a Grande Guerra, e a mutante procurou se infiltrar no governo, sem sucesso. Só na Segunda Guerra Mundial é que ela conseguiu: encontrou uma base nazista, cheia de cobaias humanas. As pessoas mágicas existiam, e lá estava cheio delas. Eram mutantes. E a seita queria descobrir de onde vinha aquela anomalia na genética deles, para poder isolá-la e manipulá-la, e usá-la ao seu próprio gosto. Por isso, eles estimulavam as cobaias com métodos diversos e terríveis. Sheeva descobriu essas coisas por que foi presa, e identificada como mutante. Sofreu várias torturas, e passou por vários procedimentos médicos. Eles não só queriam descobrir sobre a mutação, como queriam descobrir como criar um mutante. Seu dom de viver lhe permitiu que sobrevivesse àquele inferno até o momento em que o império do presidente da seita daquela época, Hitler, ruir. Depois disso fugiu. Pelo menos parte do seu intento foi cumprido: descobriu a seita e o plano dela. E outro benefício: por ter sido uma cobaia, os experimentos lhe deram uma segunda mutação. No século XXI, a seita estava mais poderosa e cuidadosa do que nunca, graças à tecnologia. Nesse século, Sheeva não conseguiu muitas informações sobre eles, apenas sobre os rumores do que de fato acontecia na Área 51. Nada de alienígenas: mutantes eram mantidos lá. E a mídia cumpriu bem o seu papel, acobertando a Área 51 e apresentando os mutantes para o mundo sobre o formato fictício de personagens de histórias em quadrinhos, desenhos e filmes. Porém muitos anos depois, a seita finalmente se mostrou, como um vulcão em erupção. Quanta desgraça! Quanto horror! Ela surgiu com o nome de Primatech. A mutação foi lançada sobre o mundo como um vírus, e muitas pessoas normais se tornaram mutantes. Pior: a Primatech expulsou a maioria deles das metrópoles, a grande maioria deles, construiu fortalezas para os não contaminados, e se promoveu a nova dona do mundo, e sua salvadora. Com sucesso. |
“Mas o jogo está prestes a mudar.” |
E a American Iniciative era um dos novos oponentes do império da Primatech. Parecia claramente oposta a Primatech. Possuíam ideais fundados sobre alicerces nobres. A sombra de um país orgulhoso, que se ergueu e reuniu forças, para participar do jogo de poder. Tão ousada que foi capaz de seqüestrar Sheeva Rakshala, vista como muitos como líder dos abrigos do Outro Lado. Na verdade, Sheeva era dona de um grande grupo de abrigos, cujo principal propósito era ajudar os demais abrigos necessitados. E por se tornar uma figura tão presente numa causa tão justa, acabou ganhando status que, segundo a própria humilde Sheeva, não eram necessários. Mirando o seu reflexo frente ao espelho, Sheeva observava seus olhos, duas jabuticabas misteriosas. Recordava-se do dia que Michael Grayson matou dois de seus amigos, invadiu sua casa/base – uma delas – e a abduziu. Ela era A Lista. Em sua poderosa memória, Sheeva guardava os dados de todos os mutantes que existiam, e até dos que já haviam morrido. Por isso, tornou-se prisioneira dos Grayson havia quatro anos. Eles queriam algo de si. Mas... Havia algo de errado. Durante esses quatro anos, os progressos que haviam obtidos da parte da mutante indiana não haviam sido muitos. E os que haviam sido conquistados, pareciam ter sido meramente entregues por ela, como se aqueles dados, em especial, não fossem mudar nada. E de fato: não mudavam. Sheeva era mesmo prisioneira deles? Ou eles eram prisioneiros dela? No Outro Lado, havia um exército poderoso pronto para resgatar sua líder sequestrada. Então por que ela continuava ali? Por que permanecia no jogo dos Grayson? Quatro breves anos. Quatro curtos e pequenos anos haviam se passado na longa vida de Sheeva Rakshala. Ela era mantida num quarto confortável pelos Graysons. Tinha acesso ao que desejava, parecia estar passando férias num hotel de luxo. Quando desejava algo que não tinha em seu quarto, pedia e eles lhe dava, Às vezes sentia vontade de pintar, e pedia telas e tinta à óleo aos Graysons. E teve até um dia que presenteou Michael Grayson com uma pintura super realista. Na tela, tinha retratado Claire e Michael. Sheeva fez questão de retratar no rosto de Michael, na pintura, o sorrisinho traquinas que o homem tinha. Era uma das características mais marcantes dele. Naquele quarto tinha até uma tela de plasma! Preferia ela do que as holográficas. Dos canais limitados da tv, a última notícia que mais chamou a atenção foi a morte de Amélia, presidente da Primatech. Não ficou comovida. Testemunhou a queda de Napoleão. Depois dele, Hitler também foi derrubado. A Primatech era fria e seletiva quanto aos seus líderes: se eles não fossem eficientes, caíam. Passos. Pelo ritmo dos passos, era ele. Encerrando a sua reflexão, ela colocou a mão frente à torneira da pia e água fresca saiu dela. Lavou seu rosto, enquanto ele falava à porta – ouvindo cada palavra claramente, e depois secou-se. Como sempre, com muita calma, a morena saiu do banheiro e voltou para o quarto, sentando na cama, de frente para a porta que ia ser aberta. Ela naturalmente mantinha-se séria, era de sua natureza, mas não negava algumas risadas quando algo engraçado lhe era apresentado. Antigamente, quando estava junto dos seus amigos, ela até fazia piadas . Ela estava suportando bem ficar sem eles. Sempre conseguiu suportar se afastar de quem amava. Mas e eles, como estavam lidando com sua ausência? Michael Grayson surgiu à porta. Quer dizer, só o rosto dele. E depois sorriu com os lábios e com os olhos. |
- De fato. Minha última esperança de relembrar os meus primeiros vinte anos é que essas memórias surjam como sonhos, e eu as identifique... Depois de tantos anos, sonho com tantas coisas. Mas a esperança é a última que morre, não é verdade, Michael? – era por isso que ela não gostava de ser despertada; falava isso como um pedido de desculpas. |
Porém dependia da situação. Talvez fosse por isso que Michael Grayson era o responsável por cuidar de Sheeva. Claire era muito séria, e tudo que a American Iniciative não precisava era que a morena se voltasse contra eles. Então Michael, o que tinha mais tato, mais sensibilidade, lidava com o que parecia a tarefa mais frágil: ele literalmente negociava com a Chimera. Logo que ele abriu a porta, o ar trouxe o cheiro perfumado do corredor, e junto o odor de graxa e suor que vinha de Michael. Ele, por fim, entrou no quarto e a porta se fechou. O cheiro tomou conta do ambiente: pelo menos para os sentidos aguçados dela. |
- Michael... Você estão procurando uma agulha no palheiro. Essa expressão é velha, não sei se você vai entender. Estou querendo dizer que você está procurando uma concha na areia da praia. – Ela sorriu, e desistiu; Michael provavelmente também nunca teve a chance de visitar uma praia, procurar conchas na areia e nadar na água salgada: o homem destruiu a natureza. Porém Sheeva viveu aquelas eras – Certo. Essa você também pode não entender. |
Seus olhos voltaram depressa para Michael. |
- Eu ainda não o encontrei. Está sendo difícil lembrar do hidrocinético... Como vocês sabem se o X-99 está vivo ainda? As estatísticas de encontrá-lo são muito complicadas. Nos últimos dez anos ele não manteve um padrão, ele mudou-se constantemente de lugar a lugar, praticamente como se não quisesse ser encontrado. E à julgar por suas habilidades, ele pode sobreviver em praticamente todos os ambientes. |
Mas o que entregava quando Sheeva mentia? Quais truques uma mulher de quinhentos anos podia usar para mentir para alguém? A aura ao redor do feminino já era poderosa; mulheres eram conhecidas por grandes feitos, e até por serem superiores aos homens. E quando se tratava de uma mulher com quinhentos anos de experiência, o quão poderoso o feminino nela podia ser? Não dava pra saber se Sheeva estava mentindo ou não. Entretanto, se ela estava mentindo... Por que o faria? |
- Sente-se – disse ela, levantando da cama e apresentando a mesma para Michael sentar-se, caso estivesse com vontade. |
Ela foi até a geladeira, e pegou uma jarra de suco sintético de morango. O original era azedinho – ela preferia o original, mas em forma de vitamina, ou uma saladinha com leite condensado. Já os morangos daquela nova era tinham um gosto diferente: haviam sido modificados para melhor agradar a sociedade. Um pecado, para Sheeva. Deus havia feito o morango perfeito, afinal. Mostrou a jarra à Michael, oferecendo a ele. |
- Mas como estávamos conversando – dizia Sheeva, enquanto enchia o seu copo de suco – Eu posso fornecer a vocês informações sobre os últimos paradeiros do X-99. Pelo menos assim você e Claire podiam traçar ao menos uma rota, ou cercar uma região em busca dele. |
Última edição por Pierre em Qua Fev 06, 2019 1:33 pm, editado 1 vez(es)
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- Mensagem nº5
Re: Behind Enemy Lines
Sheeva também busca pelo suco, e parece entender a falta de retorno por parte de Michael como permissão para serví-lo também. Como Jesus, que um dia lavou os pés daqueles que lhe eram submissos, Sheeva despeja o líquido no copo de Michael, para depois colocar um pouco para si. Por fim, senta, e convida seu anfitrião a fazer o mesmo. Depois de todo aquele ritual, medido cautelosamente para dar veracidade ao que diria a seguir, a mutante revela o que descobrira sobre o mutante X-99. Nada. |
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- Mensagem nº6
Re: Behind Enemy Lines
-... Michael, aproveite que você está de joelhos, limpando essa bagunça. – disse Sheeva, sem demonstrar nem um pouco de malícia em sua voz ou face, ou até mesmo no olhar. |
- A sua máscara caiu no chão também. |
Definitivamente, Michael Grayson era alguém sensível e paciente. Tanto tempo interagindo com sua prisioneira, esperando por uma resposta específica... Será que ele havia subestimado-a? Qual parte da equação estava errada? Que peça faltava no quebra-cabeça que Michael estava tentando montar, naquele quebra-cabeça que a quatro anos ele achou que iria montar com sucesso? Sheeva deu um gole no seu suco de morango, e depois ficou observando Michael. Seus olhos fitaram o braço trêmulo, o sangue escorrendo por entre os dedos do punho cerrado de raiva. A morena desviou a face, virando-se de costas para Michael e caminhando para longe dele, enquanto sentia a fofura do carpete com a sola dos seus pés descalços. Violência. Aqueles olhos negros, aparentemente apáticos, subiram pela parede, até encontrar a tela de plasma desligada. Violência. Fixando ali seu olhar, ela recordou-se de toda violência que já havia testemunhado. Que bela dádiva, a de viver para sempre. Lhe fazia enxergar a vida por completo, e não por pedaços. As eras que a humanidade passava eram os pedaços. Viver durante uma era lhe dá uma perspectiva sobre a vida, que dependia do clima da era em que você viveu. Mas viver várias eras lhe dava uma visão muito mais ampla. Ao longo de sua vida, Sheeva contemplou o ápice da violência humana, as Duas Grandes Guerras. As nações se retaliaram. Os mais fracos foram despedaçados. E os loucos dançaram na chuva de sangue. |
- Tanto horror, Michael Grayson... Esse mundo viveu tanto horror... A violência é uma das faces mais feias que a humanidade tem para mostrar. |
- Ameaçar tirar a minha vida? – um sorriso educado surgiu nos lábios carnudos de Sheeva – E se tornar o diabo que perseguirá os meus seguidores? Olhe as suas palavras, menino. Elas são tão infantis! Sua reação, tão pura e sincera, revela algo muito importante sobre você... |
-... Que você sabe muito pouco sobre a vida e sobre a morte. |
- Eu li muitos poemas, escritos por homens sábios. Eles falavam sobre a vida e sobre a morte. Mas do que importou a inteligência e a compreensão deles? Não puderem resistir a vida e evitar nascer neste mundo, e tampouco puderam evitar a morte, que veio buscá-los. E o que eu, Aquela que Não Conheceu a Morte, posso dizer sobre eles? Digo, portanto, nada. Não sou mais especial que eles. Um dia, talvez eu morra, de fato, como você disse. E como eles, como você, a morte não me disse quando virá. |
Depois disso, Sheeva se afastou. Jogou os cabelos para trás, e sentou-se na macia cama. Por alguns instantes, ela permaneceu silenciosa. Mirava a parede, e seus olhos pareciam passear no passado. Voltou seus olhos para o Grayson mais velho. |
- Eu nunca me esqueço. E existem ocasiões, que são imperdoáveis. Eu nunca vou me esquecer de você matando meus amigos na frente da minha casa. |
Não seguidores. |
- É o desejo que mantém a chama da vida acesa até que ela se apague, até que chega a hora que nem o desejo pode continuar sendo o seu combustível. Mas a chama da minha vida não se apaga: e os meus desejos, que são muitos, continuam a alimentá-la. – ela faz uma breve pausa para umedecer sua boca, e depois continuou – E com que propriedade você diz que irá me matar? Por que você não me matou naquele dia, junto com os meus amigos? Achou que sua investida e seus planejamentos iriam funcionar, ao longo dos anos? Mas eu estou acostumada com o passar dos tempos. E não pense à essa altura do campeonato em me torturar: eu também estou acostumada com a dor. Ela me visitou em muitos momentos, e sob muitas formas e estados diferentes. Sabia que fui torturada pelos nazistas? Sabia que já enterrei maridos, filhos, e filhas? E amigos? E agora, a revelação mais surpreendente... |
Em momento algum ela perdeu o ritmo; a paciência, ou a compostura. |
- Sabe quem veio me visitar diversas vezes, em vários momentos da minha vida? A Morte. Eu já olhei nos olhos dela, Michael. Eles são poços negros, no crânio daquela caveira. E na escuridão deles, habitam todos aqueles cujo respiro da vida já se foi. Mas ela não me ceifou com sua grande e curvada lâmina. Não colheu minha alma. Apenas ficou lá, me observando. No frio das montanhas, quando meu corpo estava entre os destroços de um acidente aéreo; nas águas do oceano, quando um naufrágio violento sepultou no mar uma das minhas famílias; no campo de batalha, quando entrei na frente de um companheiro, para meu corpo ser alvejado por tiros. Eu apenas fiquei lá, deitada. Meu tórax inflava e desinflava, com dificuldade. E do meu lado, a Morte. Agachada. Olhando os meus olhos abertos. Eu esperei que ela passasse seus dedos ósseos sobre os meus olhos, e os fechar para sempre; e eu iria para a escuridão dos poços da Morte... Mas não. Ela apenas... |
- Ficou lá, me observando, dando o seu sorriso de caveira, com o crânio envolto no capuz do seu manto. |
Era incrível a contradição. Ela, que estava presa ali a quatro anos, não parecia ter pressa. Enquanto que Michael Grayson parecia correr contrar o relógio. De fato, ele tinha pouco tempo de vida para viver – da perspectiva de Sheeva, claro. Imaginava-se presa ali até o dia em que ele viesse lhe visitar, com os cabelos grisalhos, e rugas em seu rosto acompanhando o sorriso traquinas. Mas não, Sheeva não podia perder esse tempo. Afinal, enquanto Michael envelheceria e ficaria decrépito, o mesmo aconteceria com os seus companheiros, nos abrigos. Levantou o olhar da mão ferida de Michael, para o rosto dele. Depois de observá-lo um pouco, uma curiosidade antiga lhe tomou. Levantou-se, e foi até ele. Parou à sua frente, e levou a mão ao rosto dele com suavidade. E no semblante dela, tristeza. |
- Por que, Michael? – passava o dedo sobre a bochecha e maxilar dele, sentindo a barba que começava a crescer – Você precisa disso? Realmente precisa alcançar este extremo? Vocês são uma organização tão grande... Me deixem em paz. Eu, e todos os outros miseráveis. Nossa vida já é difícil o suficiente. |
Marcus- Admin
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- Mensagem nº7
Re: Behind Enemy Lines
O pôr-do-Sol indicava o fim da tarde, provavelmente o dia se aproximava das 7.00pm. Se o horário nas proximidades da base da American Iniciative era 3.13pm, aquela filmagem estava sendo realizada na região norte do continente europeu. Coincidentemente, aquele era um local onde a sociedade construída por Sheeva era bem difundida, com famílias abrigadas e bases militares que traçavam as próximas estratégias da milícia. Logo, apesar do alcance de Sheeva ser a nível mundial, aquele poderia ser considerado o marco zero de seu reinado. |
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- Mensagem nº8
Re: Behind Enemy Lines
- Não diga isso dessa forma... Dizer que faltou a eles determinação, foco e inteligência é, de certa forma, desrespeitoso. Cada um tem seus próprios limites. Você sabia? Nenhum tigre é igual ao outro. Cada um possui um padrão de listras diferente. Todavia, eu não gosto de glorificar-me. Louve-te o estranho, e não a tua boca. Agradeço seus elogios... Você estudou bem a minha personalidade. |
Como se eles houvessem perecido. E também cobrir a malicia original daquela frase com lisonjas foi um truque astuto. Ela não se deixou levar pela carícia daquelas palavras. O mais triste de tudo era que aquele homem não desistia de seu intento. Que intento era este, ao certo, Sheeva não compreendia – somente imaginava. Porém agora, ela podia elevar suas expectativas para um novo naipe. Demorou muito tempo. Sheeva não costumava demorar para decifrar um individuo ou uma organização, com os materiais certos, ou com a situação certa. Bastava ter as armas necessárias. Mas para decifrar o seu carcereiro, e a American Iniciative, a mutante precisou explorá-los ao máximo. Forçar o limite dos irmãos Grayson. Eles não lhe deixaram muitas brechas para interpretá-los. Mas agora Michael saia de perto de si, aproximando-se da tela que estava na parede, e Sheeva não pôde fazer nada além de olhá-lo. Pelas costas ela o observava, e era como se a sua sombra crescesse e finalmente ameaçasse tudo o que importava para si. Não adiantou implorá-lo para que lhe deixasse em paz, e aos seus amigos, seu povo. A maldade: finalmente a máscara de Michael Grayson e da American Iniciative caíam por terra, e a indiana tinha a sua conclusão. Agora, Sheeva precisava ser mais cuidadosa do que nunca. Enquanto seu algoz ligava a tela, Sheeva sentou-se na cama, como se fosse assistir a algum programa. E quando a imagem aparecia, um misto de alegria e tristeza lhe tomava. A alegria vinha por ver aquele lugar: o primeiro abrigo que Sheeva fundou, quando começou a ter de fato influência através do mundo. Foi ali que ela começou a exercer o que ela considerava a a sua vocação. Eram as primeiras imagens que via dos seus companheiros em tempos, o mais próximo que chegou deles em quatro anos. Então para ela, foi uma forma de matar a saudade. Ver que eles estavam bem confortou e aqueceu seu coração, e ela permitiu-se deixar nascerem lágrimas puras em seus olhos escuros, como se elas pudessem lavar alguma coisa que estava dentro de si. E aqueles olhos obscuros, inexpressivos e costumeiramente sem vida, por um instante, se tornaram jovens e cheios de brilho. Secou suas lágrimas. Ela não se importou de chorar na frente de Michael, apesar dele não merecer nenhum vislumbre da riqueza que havia dentro do seu coração. |
- Pensa na possibilidade de eliminá-los e sequer tem pesadelos à noite... Mas também diz que sente muito que sua revolução tenha que fazer vítimas. Você é contraditório. Tente se controlar, Michael. Na sua ânsia por transmitir o pavor que você é capaz de gerar, você acaba tornando-se uma figura pouco temível. – alfinetou Sheeva. |
- Seus semelhantes não representam nada para você, Michael. Se representassem você não colocaria a vida deles como moeda de troca. Você seria um líder justo e nobre, e se colocaria na frente deles para guiá-los, e não os guiaria lá de trás, manipulando o jogo de poder de forma suja. O líder que guia seu exército mandando-os na frente de si... Esse líder não tem poder. Não tem honra. É tangível e mortal. Alcançável. – um sorriso pequeno e orgulhoso surgiu no canto dos seus lábios – Você é assim, Grayson. Você e sua irmã. |
Depois disso, ficou em silêncio. Matava sua saudade, observando as imagens que eram mostradas na tela. Por alguns instantes, conseguiu sentir-se lá. Recordou-se do clima frio, desencadeado pela coroa de montanhas que abraçava o aglomerado de moradas. De como o sol não atingia as casas pelo início da manhã e do meio para o final da tarde. Recordou-se de Fabianne, sua bela amiga morena de cabelos cacheadinhos e negros, e olhos cor de mel. A família dela era linda. Ela era casada com Brian, um alemão com características bem nativas, e a mistura deles dois gerou três crianças lindas. Fabianne podia ver num raio de quilômetros, enquanto Brian era dono de uma força física desumana. Também lembrou-se da querida e velha Judith, uma meiga telepata que ajudava a todos com o que podia, servindo de psicóloga, terapeuta e psiquiatra. Todos morreriam pelas mãos de Michael Grayson, a não ser que Sheeva colocasse um fim naquela insanidade. Será que não havia outra escolha a não ser vender o X-99 para Michael e Claire? O timer não precisou descer um segundo. Sheeva não precisou de tempo para medir as questões na balança. Desde o início, quando ele citou a sobrevivência do seu povo, ela já havia escolhido sua resposta. |
- Desligue esse timer agora, Michael. |
- Eu te contarei onde está o X-99. |
Marcus- Admin
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- Mensagem nº9
Re: Behind Enemy Lines
Apenas a voz de Sheeva podia ser ouvida. Michael fica quieto o tempo todo, sem nem mesmo encarar a adversária nos olhos. No momento em que ela pede para pausar o timer que controlava a longevidade das vidas de seus aliados, é quando a alma de Michael parece retornar ao seu corpo. Com as expressão altiva, caminha mais uma vez até Sheeva e fica a poucos centímetros dela. Pode ouvir sua respiração calma e o aroma cítrico presente em seu hálito. Sente também o cheiro amendoado presente nos fios de cabelo da mutante. Era agradável e, ao mesmo tempo, nauseante - como a própria Sheeva. |
Marcus- Admin
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Re: Behind Enemy Lines
Um dos rapazes, que não parecia ter mais do que trinta anos, estica o braço direito e faz menção para que Rosario o siga. Atravessam o heliponto até chegarem num elevador social. Acomoda-se em uma poltrona de veludo enquanto os andares eram ultrapassados. Uma vez presente no piso térreo, é guiada uma vez mais pelo homem para um amplo salão, seguido de um corredor indicado como acesso da ala oeste. Após o atravessarem, vêem-se numa sala composta por diversos móveis grandes e aparatos eletrônicos de última geração. Apesar de muito bem equipada, a sala era tida por Rosario como exagerada. |
Pierre- Mensagens : 16
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- Mensagem nº11
Re: Behind Enemy Lines
Ele dá alguns passos para dentro do salão, e as portas se fecham, enquanto ele mira os rostos de Michael Grayson e Rosario Santiago. |
- Boa tarde, senhores. – disse Phobos, sorrindo triunfante. |
Ele era um criador. O lado ruim das viagens estava sobre o fato de que elas o incapacitavam na hora de executar suas idéias, restringindo-o. Limitava-o a apenas ter idéias. Olhando pela janela do helicóptero, ele só via montanhas. A American Iniciative havia escolhido um terreno bastante ousado para fazer sua base. Louis olhava e admirava aquele tom tão puro do branco nas neves que cobriam as montanhas como se fossem suas vestes. O céu estava nublado, e dele caia uma branda cortina de flocos de neve. Em determinado momento, ele notou movimento dentro do helicóptero: era um dos homens, e estava acenando para Phobos colocar o fone. E Phobos o fez. Pelo canal de rádio interno do helicóptero, o homem o informou de que estavam chegando. Curioso, o cientista sentou-se em um dos bancos do outro lado do helicóptero, e olhou por aquela janela, vendo a base. Ela era enorme e também era cinzenta como as montanhas. Um desavisado poderia confundí-la com a paisagem. O helicóptero desceu. As portas se abriram e Phobos desceu do veículo. Sentiu-se muito mais à vontade lá fora. Ele parou por um instante, observando que havia um outro helicóptero presente no local. E também apreciando a paisagem: o vento açoitava seu rosto com chicotadas geladas, e os flocos de neve eram arrebatados violentamente pelo turbilhão criado pela hélice, que girava violentamente. A American Iniciative ganhava seu primeiro ponto positivo com o cientista: o lugar era lindo, e o clima, agradabilíssimo. Na entrada externa da base havia dois homens em seus ternos elegantes, e um deles se aproximou de Louis, que até então não havia se movido do lugar. A hélice já diminuía seus movimentos, desligada, e Phobos agradecia aos céus por aquele barulho infernal que o seguiu durante toda a viagem finalmente estar terminando. De uma forma ou de outra, depois que entrasse no recinto de Michael e Claire Grayson, não mais o escutaria. |
- Senhor Von Lohengrim? |
- Em pessoa. |
E por que não correria? Ela estava envolvida. E se ela estava envolvida, as chances de sucesso eram de noventa e cinco por cento. Afinal, sua mais nova companheira de negócios não gostava de jogar para perder. |
- Por favor, me acompanhe. O levarei até a sala de reuniões, onde o senhor Grayson o espera. |
- Senhorita Santiago... Que agradável revê-la! – disse Phobos, num tom amistoso. Ele retirou o seu casaco chesterfield, e o pendurou na cadeira que havia escolhido para sentar-se, revelando que usava um terno chumbo por de baixo. Ele estava monocromático: sua camisa era negra. Nada de gravata, pois Phobos não gostava de gravatas. |
Mas quando olhou para o outro homem que estava sentado na mesa, o seu semblante descaiu, e ele sinceramente o analisou clinicamente, desprezando-o em seguida. Num último ato de esperança, ele olhou ao redor de si através da sala de reuniões, procurando o verdadeiro Michael Grayson, mas não achou nada além de serviçais. Que pena. Aquele homem era Michael, então. Todo sujo de graxa, trajando vestes comuns e ainda por cima com a mão ferida. Por fim, fitou-o. |
- A batalha deve ter sido intensa, eu imagino. – comentava as características que compunham, naquele momento, o visual de Michael. |
- Perdoem-me por chegar atrasado, principalmente você, Rosario, que é sempre tão pontual em vários aspectos. Espero não ter perdido muito. – Então, o cientista virou-se para Michael e disse sem modéstia: – Como nunca nos vimos antes, acho digno uma apresentação, mesmo que não seja das mais festivas – embora que, sendo sincero, eu prefira assim. Eu sou Louis Von Lohengrim. Cientista, vamos resumir desta forma. Rosario Santiago pode ser considerada uma caça-talentos. Mesmo que eu costume fazer tudo nas trevas, ela de alguma forma me encontrou. |
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